36. (De São Paulo de Piratininga) Aster: uma foto – 1980

Afora a documentação que guardei do Aster, a qual recebia pelo correio (eu residia, então, à Rua Dona Veridiana, 77, ap 103, Santa Cecília. São Paulo cap) ou em mãos, tenho ainda algumas fotos feitas em 1980, como a do Paulo  Miranda e Sonia Fontanezi, desfocada, tirada por mim com uma câmera rudimentar e que aborda os serígrafos segurando o rodo segmentado, que imprimia o azul e o vermelho da bandeira francesa a um só tempo e que foi pensado por Sonia Fontanezi, ideia aprovada por Paulo Miranda, que a realizou, para a impressão de seu trabalho La Vie En (1978) e do qual (-rodo) eu havia duvidado – Julio Plaza ficou espantado ao observar a façanha. O rodo já não mais existe, mas que funcionou, funcionou! E deu certo o imprimir cerca de 550 cópias da bandeira (sendo 500 para que fizessem parte de Zero À Esquerda), prevendo uma margem de erro (ou simplesmente cópias “não-satisfatórias”) de 10%, o que era demais, mas atendia ao perfeccionismo de Paulo, o Miranda. Nada escapava ao controle de qualidade do autor do soneto-fita-métrica, daí o excesso. Até Omar Guedes Abigalil, grande serígrafo, professor de serigrafia de Paulo e amigo de todos nós achava um exagero reprovar um trabalho, por exemplo, que tivesse um chapado e em que aparecia uma falhazinha, um pontinho branco! Ele dizia: “Retoque com uma hidrográfica e pronto.” Mas de nada adiantava. Outra foto interessante, cujo autor é Paulo Miranda (em verdade, tenho cópias reprográficas ruins da mesma, porém legíveis) é a de uma sessão no Aster em que imprimíamos o trabalho de Luiz Antônio de Figueiredo Exercício Cubista e que viria, também, a fazer parte de Zero À Esquerda. Feita, sim, pelo Paulo, que nela não aparece. A mesa de impressão com vácuo, varal contendo cópias do trabalho que está sendo impresso – em pé, Zéluiz Valero recebe uma cópia impressa e Carlos Valero, sentado, se prepara para me passar o papel em branco. Eu, ali, no momento, como impressor, papel que geralmente cabia a Paulo Miranda. Essa foi uma das raras vezes em que Zé e Carlos apareceram no Aster, durante a façanha de impressão de Zero À Esquerda. Era o ano de 1980 e a revista, que se recusou a ser Artéria, para que não houvesse repetição, teve o seu lançamento na discoteca Pauliceia Desvairada, em 6 de maio de 1981, com um espetáculo multimídia, de facto. Na foto, a disposição de nossas cabeças forma um triângulo obtusângulo, tendente ao retângulo. Está todo mundo no auge de suas forças e disposição e… bonito, daquela beleza que é própria dos jovens, muito embora os irmãos Valero-Figueiredo fossem mais bem apessoados que eu. Todos muito atentos no afazer enquanto são fotografados. Geralmente, eu cuidava de parte das gravações pelo processo fotográfico, retoques de matrizes, registro, preparo de tintas, controle do papel a ser impresso, limpeza das matrizes após trabalho de impressão. Mesmo depois de termos trabalhado o dia todo: eu, Paulo e também Sonia Fontanezi, era uma alegria essa labuta noturna no Aster. Havíamos sido alunos da escola, que não quis se chamar “escola”, mas Centro de Estudos: eu havia feito Litografia com Paulo Guedes, Paulo, serigrafia com Omar Guedes [serigrafia eu aprendi com Paulo Guedes, assistente de Miriam Chiaverini e por gentileza dela, na FAAP (1979) – à época, eu era professor dos meninos Ferrari:  Lorenzo, Igor e Cristiano, no Pequeno Príncipe] e mais, Paulo e Sonia fizeram um curso de Vídeo com o jovem Roberto Sandoval que, à época, namorava Renata de Barros [Padovan], e até chegaram, mesmo que à revelia, a participar, com um vídeo, numa Bienal de São Paulo, a XVI (1981). Utilizamos, com muita frequência, o Aster para os trabalhos que constariam de Zero À Esquerda, sendo que para isto pagávamos o que era chamado de “ateliê livre”, o que incluía até os sábados em que a assistente Cidinha ficava de plantão (a jovem deve ter sido aluna de Julio Plaza e Regina Silveira. Circunspecta, pouco falava, mas mostrou-nos um seu ‘poema’, que era assim: ela bela : belo elo e que consideramos muito bom). Eram quase sempre uma festa esses encontros gráficos e, em 1981, quando a revista foi ultimada, Walter Silveira e Tadeu Jungle realizaram um vídeo (há cópia deste trabalho – era a época de início da TVDO) que foi mostrado no lançamento de Zero À Esquerda. A montagem dos exemplares da revista aconteceu no apartamento do Paulo Miranda, à Rua Doutor Villanova, Vila Buarque (Centro). No mesmo ano de 1981, o Aster encerrou suas atividades. Uma pena o desfazimento do belo projeto de escola-de-arte, que não queria ser chamada de “escola”, dado o ranço que a palavra trazia consigo. Tendo funcionado de meados de 1978 a meados de 1981, o Aster foi um centro de estudos práticos e teóricos das Artes Visuais, tendo sido uma espécie de “escola dos sonhos”, norteada pelo rigor com liberdade. Muita gente incrível passou por lá: Julio Plaza, Regina Silveira, Walter Zanini, Donato Ferrari, Paulo Leminski, Décio Pignatari, Villem Flusser, Nélson Leirner, Milton Sogabe, Omar Guedes…

Sala principal do Centro de Estudos de Artes, o Aster, nas Perdizes, São Paulo. Zéluiz Valero, Omar Khouri e Carlos Valero [de Figueiredo] em plena sessão de impressão de trabalho de Luiz Antônio de Figueiredo, que constou de Zero À Esquerda, lançada em 1981. A fotografia, de Paulo Miranda, aqui reproduzida a partir de uma cópia xerox, é de 1980.
Sala principal (de impressão serigráfica) do Centro de Estudos de Artes, o Aster, nas Perdizes, São Paulo. Zéluiz Valero, Omar Khouri e Carlos Valero [de Figueiredo] em plena sessão de impressão de trabalho de Luiz Antônio de Figueiredo, que constou de Zero À Esquerda, lançada em 1981. A fotografia, de Paulo Miranda, aqui reproduzida a partir de uma cópia xerox, é de 1980.

 

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