34. (De São Paulo de Piratininga) Augusto de Campos: Poeta

Falar em Augusto de Campos, hoje, é o mesmo que discorrer sobre como é possível (muito embora raro) adentrar os 80 anos em plena forma e produzindo poemas, textos críticos e traduções-recriações poéticas de uma maneira surpreendente, como vem fazendo esse criador desde fins dos anos 1940, mas principalmente a partir dos ‘50. Concreto histórico, é considerado um inventor, ou melhor, co-inventor de um modo que mexeu com as estruturas do fazer poético sendo que, no Brasil, esse movimento entrou como um divisor de águas: o antes e o depois da Poesia Concreta. Mesmo pertencendo a um grupo de vanguarda e seguindo procedimentos firmados pelos integrantes, a poesia de Augusto de Campos sempre apresentou peculiaridades que a fizeram única, desde que, em 1953, elaborou a série Poetamenos, num diálogo íntimo com a música de Anton Webern: o 1º conjunto sistemático de poemas concretos. Em 1955, propôs o nome Poesia Concreta para aquela que estava fazendo, juntamente com seu irmão Haroldo e com Décio Pignatari, o que contou com a concordância de Eugen Gomringer – poeta suíço-boliviano experimentador e que era secretário de Max Bill na Escola Superior da Forma em Ulm, Alemanha, e com quem Décio Pignatari havia entrado em contato. E o movimento tornou-se internacional. O percurso poético de Augusto de Campos é dos mais admiráveis, do pós 2ª Guerra à atualidade, passando por fases distintas, mas mantendo a coerência dentro daquilo que o vinha caracterizando: a originalidade e o rigor, dentro do universo “verbivocovisual”. Alguns de seus poemas já adentraram a corrente sanguínea da sociedade e fazem a alegria de tantos quantos vêm a ser aficionados da arte da palavra, por excelência, da Arte de Augusto de Campos, podemos dizer. Nessas décadas todas de intensa produção poética – peças densas em relativa pequena quantidade – o poeta praticou uma crítica de um aclaramento ímpar, versando principalmente sobre criadores-inventores de época recente, mas resgatando, por outro lado, valores do passado que haviam sido mal lidos ou nem sequer propriamente lidos. Trabalhou em textos que considerava fundamentais da poesia universal, praticando uma tradução criativa (tradução-arte, como tem dito), com o propósito de formar um conjunto significativo, em português, da melhor poesia produzida no mundo. Houve quem dissesse, em Portugal, ser Augusto de Campos o maior tradutor de textos poéticos para a língua portuguesa, de todos os tempos. E, muito embora não tenha optado pela Docência, como alguns companheiros chegaram a fazer, Augusto de Campos desempenhou esse papel didático em muitas conversas que tinha, com gentes de todas a idades, nas incontáveis vezes em que recebeu pessoas interessadas em arte experimental em sua casa, casa esta que teve tanta ou mais importância para a poesia brasileira e as artes em geral que as de Paulo Prado, de Mário de Andrade, de Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade e de Dona Olívia Guedes Penteado. Não há hoje, no Planeta, alguém com um conjunto de obra tão significativo como o que produziu, em quase 7 décadas, Augusto de Campos. E esse reconhecimento vem vindo aos poucos, de fora do País e também de dentro. Basta entrar em contato com sua obra para se ver quanta riqueza ela contém em termos de invenção/informação. João Cabral de Melo Neto – poeta mais que consagrado e com relação ao qual havia como que uma unanimidade no Brasil – chegou a dizer, em diversas ocasiões, que o legado da Poesia Concreta havia sido mais importante para o Brasil que o do Modernismo de 22. E, quando João Cabral era estimulado a citar poetas mais jovens, ele citava Augusto de Campos. Este é um dos grandes criadores do século XX, num confronto internacional (como gostava de dizer Décio Pignatari), que adentra, com pleno vigor, o Terceiro Milênio. Salve Augusto de Campos, Poeta!

Omar Khouri . São Paulo julho 2015.

Texto escrito por mim para ser lido por outrem em Congresso acontecido no IA-UNESP, no 2º semestre de 2015, pois eu estava, já, em Lisboa nessa ocasião (Pós-Doc). Augusto de Campos deveria estar presente, mas não pôde fazê-lo.

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