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LIVROS
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LIVROS: POR QUE LÊ-LOS?

 

Para que serve um livro? Para ler, diriam todas as pessoas que têm a palavra livro como parte integrante de seu vocabulário. Porém, eu diria diferente: um livro não deve necessariamente ser lido: ele até pode ser lido.

É muito bom saber que as coisas são ou podem ser assim. Acontece que os livros "querem" ser lidos e o pior desafio que se pode fazer a um deles é não lê-lo: passar pela estante, olhar com desprezo e sequer tocá-lo. Por outro lado as pessoas esperam que, se você está na posse de um livro é porque deve tê-lo lido.

Engano. Um livro pode esperar anos, até décadas ou até mesmo não ser lido por aquele que o possui. Às vezes temos um livro pelo simples prazer de termos ao nosso alcance uma fonte de conhecimentos: a coisa fica ali, disponível. Mas por falar em disponibilidade, eis aí a INTERNET. Então, não é necessário ter em casa um volume ou muitos, que venham a ocupar um grande espaço e até atrapalhar (não para quem ama livros e não apenas o seu suposto conteúdo: gosta, curte o livro enquanto objeto e fatura gráfica).

Bem, livros eu os adquiro desde a adolescência e gosto de possuí-los. Alguns adquiro para uso imediato, outros para suprir a falta, completar conhecimentos específicos, porém, alguns outros compro na certeza de poder lê-los no futuro. E o futuro chega e se torna presente e passado, bastando que estejamos vivos para ver (ler). De todos os casos de livros que em minha estante esperaram muito para serem lidos, um é o mais interessante: As Palavras, do filósofo existencialista Jean-Paul Sartre. Trata-se de um texto autobiográfico, permeado de refexões complicadas sobre o existir. Diria: um texto difícil, não tanto pelo emprego lexical como pela complexidade da carga semântica e de sua articulação narrativo-pensamental. Um texto pesado. Bem, durante meu Curso Clássico li, juntamente com alguns amigos, textos de Sartre, principalmente os de ficção: contos, teatro etc. Textos propriamente filosóficos, pouca coisa. Foi nessa época, segunda metade dos anos 60, numa de minhas viagens a São Paulo, que adquiri vários volumes do filósofo francês, entre os quais o mencionado As Palavras. Era o ano de 1967 (na época, tinha o costume de colocar meu nome nos volumes que comprava, mais o ano. Hoje - de duas décadas e meia, para cá - deixo que o livro seja um objeto ao portador...). De sua leitura, não passei da décima página. Abandonei a empreitada.


Tudo transcorria normalmente quando, lendo, em 1997, o volume autobiográfico de Caetano Veloso Verdade Tropical (diga-se: interessante, excessivo, narcísico, obra de quem passou por anos de psicanálise, com alguns acertos de contas e injustiças - com Rogério Duprat, o grande arranjador da Tropicália, por exemplo - bom porque Caetano é bom em quase todo o que fez e faz, mas, convenhamos, ninguém tem tanto para dizer, que precise de 510 páginas!). Na obra, Caetano faz referência ao texto sartreano, mostrando a maior consideração por ele.

Foi aí que me lembrei de procurar a obra em casa de minha mãe. Lá estava o volume intacto, aguardando ainda que eu me dispusesse a lê-lo. E foi o que fiz, sem nenhum prazer e eu o li na íntegra. Percebi que, se por um lado, literariamente, não era uma escritura excepcional, por outro, o pensamento de Sartre era uma coisa datada e, portanto, out of date, demodé(e).

Essa experência de ler uma obra adquirida trinta anos depois, eu a relato aos alunos que me olham, via de regra, descrentes. Mas é esta a verdade verdadeira.

Amo os livros. Faço-os, compro-os, ofereço-os de todas as maneiras. Porém penso que um livro não deva necessariamente ser lido, mas a leitura entra como uma possibilidade. Porém, um livro quer mesmo é ser lido! OMAR KHOURI



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