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FOTOGRAFIA
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UMA CERTA FOTOGRAFIA

 

Aquela fotografia havia me provocado náuseas: tal compleição física me causava repugnância e o maior desejo meu era não vê-la e, a seguir, esquecê-la. Como?! Como poderia o fotógrafo ter flagrado algo inimaginável? Não, não era eu aquele ser puro nariz, que faria mirrar o poemeto célebre de Bocage (Nariz, nariz e nariz), parodiado/recriado belamente por Juca Chaves. Uma magreza de fazer dó: um nariz amparado por um esqueleto andante (ou supostamente andante). Um braço-só-osso estendido, apanhando das mãos da paraninfa aquele diploma. Era o ano de 1969 e eu acabava de concluir o Curso Clássico, no IEDAP. É, a fotografia como um signo indicial, ou seja como um signo que traz as marcas físicas do seu objeto (no caso, eu ) incomodou-me além do normal. Fosse um desenho, uma caricatura (um nariz com uma pessoa
por detrás) seria tolerável, mas uma fotografia?! Abominei aquele registro, não o adquiri do fotógrafo e releguei o fato (a foto) ao esquecimento.

Eis que um dia, neste Ano da Graça de 2000, falando com meu irmão Válter ao telefone, ele me disse: "O Volpato me entregou uma foto sua, talvez dos anos 60 e que ele encontrou entre os encalhes da firma. Não
sei se você se lembra dela. Deve ter sido em sua formatura. Está guardada. Quando você vier para Pirajuí, eu lha darei". Estremeci, mas nem tanto. Aquela fotografia me veio à lembrança como, nada mais nada menos, que uma FOTOGRAFIA: a prova da minha feiúra juvenil. Mesmo assim, fiquei ansioso para revê-la. Aquele esqueleto coberto com panos de cor cáqui!

Examindo a foto calmamente, percebi que não sentia nenhum asco, não tinha nenhum pejo. Sem problemas, eu a mostraria a qualquer pessoa, dizendo que era eu e como eu era magro e como parecia deprimido naquela solenidade de um dezembro escaldante. Guardei-a com muito cuidado, do mesmo modo que conservo fotos, para mim, preciosas. Já que fiz referência ao grande Bocage, poeta português que viveu de 1766 a 1805, vai aí, como brinde aos meus leitores, seu precioso poema por mim acima referido:
 
Nariz, nariz e nariz
Nariz que nunca se acaba,
Nariz que se ele desaba
Fará o mundo infeliz!
 
Nariz que Newton não quis
Descrever-lhe a diagonal,
Nariz de massa infernal,
Que, se o cálculo não erra
Posto entre o Sol e a Terra
Faria eclipse total.
 
OMAR KHOURI

 


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