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COMUNICAÇÃO
nomuque.net

DECIFRAÇÃO

 

            Somos todos leitores de tudo. Do Mundo. Os signos (os complexos sígnicos) se nos impõem: obrigam-nos a lê-los. Estamos constantemente fazendo leituras, mas raras vezes nos apercebemos disto. Tudo pode vir a funcionar como um signo (lemos, por exemplo, pessoas: a primeira leitura é sempre a da aparência - físico, vestimentas, gestos etc; a segunda é a leitura de sua fala: timbre, modo, vocabulário empregado, sotaque - esta chega a ser mais importante e corrige ou reitera a primeira, já que o código verbal, sendo o código hegemônico, impõe-se a outros fatores em nossa leitura de pessoas. Ex: "É um cara tão alinhado, bonito e arrogante e tem um português vergonhoso. Deveria calar a boca!" Ou, então: "Ninguém dava nada por ele e veja como é alguém diferenciado, culto!"). Nossas leituras, nossa leitura do mundo está diretamente subordinada ao nosso repertório. Todos temos repertório, com carências específicas, elevado em alguns campos. Para se ter um repertório elevado num dado assunto é preciso um grande empenho: tempo para despender grandes esforços, o que pode também implicar gastos em pecúnia. A leitura ou decodificação de tudo aquilo que se nos impõe - os signos querem ser lidos - é o mesmo que uma decifração. Temos visto ao longo da história (e também da estória) grandes decifradores: Édipo, que decifrou o enigma, livrando Tebas da Esfinge, aquele que interpretou o sonho de Alexandre o Grande, Champollion, William Legrand-Poe e eu acrescentaria, entre outros tantos, Décio Pignatari. Há, é certo, leitores - como os acima citados - privilegiados. Ainda bem! Assim, sempre poderemos contar com quem se desincumba dessas tarefas complexíssimas, quando nós mesmos não somos capazes. Porém, nós também podemos ser leitores privilegiados em campos específicos: desde ler almas, até analisar fatos que envolvem o nosso dia-a-dia, passando por poemas e outras coisitas mais. Alguns conselhos, como sempre, de graça: 1. Nunca tomar atitudes precitadas e recusar-se à leitura, frente a algo que se nos apresenta com dificuldades intransponíveis; 2. começar procedendo a um exame cuidaoso da coisa como se nos apresenta: na sua aparência (exterioridade) mesma; 3. ir detectando indícios de coisas mais ou menos conhecidas e ir testanto a sua veracidade, assumindo o certo e descartando o inverossímil; 4. ir num crescendo até chegar a resultados satisfatórios - aceitáveis - em termos de decodificação. Tenha sempre em mente que ninguém tem a resposta definitiva para nada; signos não se esgotam no que têm de interpretabilidade (num dia desses tentarei expor o conceito de SIGNO de Charles Sanders Peirce, detendo-me na questão do Interpretante). O que se pode ter é, não a verdade absoluta, mas parcelas satisfatórias de uma verdade maior, que estará sempre num futuro, como meta a ser alcançada. O importante é que, de algum modo nós venhamos a ter leituras que possam satisfazer, embora temporariamente nossa sede de compreensão do mundo. Não há nada que não possa ser lido por algum representante de nossa espécie (Poe-Legrand, em "O Escaravelho de Ouro", diz que não há nada de tão engenhoso que tenha sido elaborado por um ser humano, que outro ser humano não possa decifrar), nem que seja arranjando uma explicação de como é impossível até o momento a compreensão de um dado fenômeno. Ninguém esgota um signo, mas consegue explicações satisfatórias para o mesmo. Leitores diferentes em épocas diferentes = leituras diferentes. Sempre sobra um pouco para nós, por mais que o signo tenha sido dissecado e temporariamente se mostre sem interesse. Obras de arte têm sido lidas ao longo de suas existências. Sempre sobra algo para um leitor a mais descobrir. Nem que seja em termos de uma relação do signo em questão com outros. Quanto à Arte Moderna, há problemas: esta exige, para uma apreciação/fruição, um certo conhecimento a mais, o que vale dizer uma visão geral de como evoluíram as coisas da Arte no Ocidente. (Não é que as coisa fossem fáceis na época de Rafael, ou de Rubens, ou de Vivaldi, ou de Mozart. É que aquelas artes ofereciam mais elementos de aproximação para com os possíveis fruidores. Porém, eles  - certamente - não compreendiam aquelas obras na sua mais completa complexidade. E a Arte Moderna oferece bem menos elementos de aproximação, mas oferece, de qualquer modo). Mas as coisas estão aí e não devemos fugir de nossa obrigação de proceder a leituras. Por exemplo: como entender o "Branco sobre branco", de Kasimir Maliévitch? Ou o poema de E. E. Cummings que se segue?

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            Uma dica: começar sondando o que há fora e dentro dos parênteses. Um incentivo: trata-se de uma obra-prima de poesia do não-verso, em que o olho gráfico do poeta, norteado pelo cerebralismo e pela sensibilidade, constrói uma obra limite entre as Artes Plásticas (Gráficas) e a Poesia propriamente dita.
OMAR KHOURI



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